segunda-feira, 13 de abril de 2009

O Rosemberg Filho não fica mudo


Mexendo nas leis.
E as bases?
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Por Luiz Rosemberg Filho & Sindoval Aguiar

Rio de Janeiro - Somos movidos por dúvidas e contradições. E o importante segue sendo derrubar essa arquitetura do horror imposta tanto ao país como à cultura. Já criticamos a não-tática do atual ministro da Cultura, em relação as suas tristes indicações para a nova composição e direção da Ancine. Já estamos de saco cheio desses arranjos entre partidos políticos, burocracia e poder, todos frutos da mais baixa podridão humana. E os indicados, que nos desculpem seus puxa-sacos de plantão, têm a capacidade peculiar de serem medíocres mas dispostos a tudo por um bom empreguinho e poder na repartição dos que nunca gostaram do cinema brasileiro. E muitos nem sabem o que é isso! Mas... enganam e faturam seus altos salários.

Isso não nos impede de, depois, defendermos as novas mudanças na Lei Rouanet, para transcender o imobilismo classista e parasitário da anterior. É preciso que a cultura brasileira ultrapasse a si mesma, elevando o nível de entendimento e exigências. Achar que Xuxa, Trapalhões, Daniel Filho... podem ter 100% de abatimento nas Leis de Incentivo à Cultura, em suas aberrações comerciais, sempre foi crime de lesa-pátria pois foram e são inimigos de um saber mais orgânico e profundo. Nessas “celebridades” do acaso, existem vestígios expressivos da barbárie e do fascismo, tal é o investimento na deformação do coletivo. Ou seja, o não-conteúdo exposto permanentemente em seus trabalhos é o quê? Para além de todo esse lixo reunido 24 horas por dia, por anos e anos, chega-se à contribuição dos partidos, políticos e por fim ao poder que sempre lucra com essa triste e pobre adequação de tudo e todos ao horror em forma de leis e exigências idiotas. Papelotes malhados desse nosso inferno.

Lamentavelmente nunca tivemos um ministério da Cultura verdadeiramente preocupado com a complexidade do saber. Nosso ministério sempre foi um cabide de emprego que nunca disse a que veio. Colocando-se sempre entre o capital e a realização, atrapalha mais do que ajuda. E foi sempre assim para que se desse visibilidade e poder a burocratas de carreira. De qualquer forma, essa mexida na Lei Rouanet nos pareceu mais que necessária. E se desagrada aos velhos espertalhões de sempre, ótimo! Vão ter de pensar (se é que sabem!) numa lógica cultural mais humana, criativa e profunda. E é essa dimensão da criação que traz de volta a sensibilidade como questão principal.

Ora, e por que não se pode ganhar com um trabalho original e pensado? Claro que é mais fácil ganhar e enganar com as “celebridades” do acaso, adequadas ao universo da mentira. Que nos desculpem nossos muitos opositores, mas, para nós, a materialidade de um saber-profundo é uma outra coisa. É Martins Pena, Villa-Lobos, Oswald de Andrade, Glauber Rocha, José Celso Martinez Correa, Versus, Ponto Cine, Negro Leo, Joana Collie, Macalé... e muitos outros mais. O país é privilegiado no seu eterno recomeçar.

Desde que nos entendemos por alguma coisa, mais objetivamente em relação ao nosso cinema, sabemos que sua produção, distribuição e exibição dificilmente poderão ser atendidas e, muito menos, mexidas culturalmente. Somos apenas esforços e avanços difíceis e isolados desde 1549, quando aqui aporta a esquadra semelhante à IV Frota de ameaças e vigilâncias para ocupação religiosa, econômica, política e militar, trazendo os avanços científicos e tecnológicos de varões assinalados de controles, saqueios e extermínios: de mitos, oralidades e da linguagem. Uma imposição ideológica do ciclo de expansão do capital de um tempo que não termina. A da submissão ao outro, quando nem sabíamos que o outro somos nós! E que a alteridade quem a faz somos nós também. O que nem pensamos mais porque nossa submissão tornou tudo subalterno, vulgar e sarjetado!

Agora, se nem o analfabetismo crônico nem a miséria crônica resolvemos, como resolver o problema da cultura e outros mais que lhe são originários, sem uma reforma de base, sempre invisível? O pior é termos que ouvir também este outro, para as nossas pretensas caminhadas. Que tal fazermos um paralelo, antes de arriscarmos qualquer resposta? Mas, paralelo de quê? Claro que de ciclos datados e eternos, de 1549 a 2009! O ciclo atual da barbárie que tentamos tocar, mas ao lado do outro que pouco ou quase nada se preocupa com a alteridade! Foram sempre forças de controle, domínio, expansão e extermínio que ninguém consegue atingir. E de associações perigosíssimas. Ciclo de uma cultura global, tomando de assalto o mundo e fazendo da linguagem sua mídia. Única, absoluta, dogmática! Com a riqueza e a miséria limitando-se na sarjeta.

Faz-se do mercado, excelência! E da cultura, sarjeta! Esquecendo do humano e de sua cultura, esta que somente pode existir a partir do imaginário que a arte corporifica com imagens, som, linguagem de projeções e perspectivas infinitas! O humano espectro que ainda nos ronda, como na reforma da lei, e que não permitiu no passado que o positivismo Contiano pusesse sob a submissão do científico. Porque toda humanidade é mais do que o mercado; é abstração, conjunção de subjetividades. E o que temos que estudar e avançar são as sociedades, como as deste ciclo, respeitando mais a filosofia da história, mais a evolução humana e cultural contra a barbárie e a esterilidade que se consensualizou.

Vale todo o esforço para mudanças! Afinal, o que são as leis? Necessidades ou forças perigosas? Toda lei e toda cultura estão sempre sob algum domínio. Mudar é preciso! Valendo o esforço, como deste sociólogo que está ministro, tentando aplicar às leis a estética da sociologia, tentando ampliar a paisagem em terreno minado! Em geografia cartorial, política, econômica e, ainda, fundada em paraíso intocável! Nossa cultura atual tem procurado uma base mais sólida para a tentativa de experimentos e avanços em áreas necessárias, de nossa descoberta por nós mesmos.

Mas, onde está a base? Como responder se nem o sistema pode defini-la? Muito menos nós. Tatear é preciso! Para o nosso cinema, essa base depende fundamentalmente de um mercado menos dominado, e onde a dominação começa também na base; na produção, na distribuição e na exibição. Com o nosso imaginário ficando sem projeção, sem telas! E com os nossos recursos, o do imposto que nos incentiva, ficando de posse do dominador, as corporações transnacionais, quando nem nacionais ainda somos. E fazem uso deles, como fazia o invasor religioso e militarizado, nos vendo como exóticos selvagens e decaídos. Vindo nos levantar para o simulacro da cultura deles!

Que as alterações da Lei Rouanet possam ser bem-vindas! Se tocam na estética cultural sociológica, serão defendidas pelos que ainda acreditam no Brasil! Além de Conte, Durkhein e Max Weber. Mais Lukacsiana, Florestan Fernandiana e Milton Santiana: se queremos mexer em algo, tem que ser pela base! Chega de arremedos que nada modificam. Precisamos de um país verdadeiramente nosso, ousado e criativo!

10/4/09

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