sexta-feira, 15 de junho de 2007

Blogosfera em cena: anotações iniciais acerca dos videoblogs e sua relação com a memória na contemporaneidade[1]

Igor Amin Ataídes[2]

Supervisor: Eduardo Antônio de Jesus
[3]

Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

Resumo

O estudo pretende refletir sobre novos territórios típicos da Cibercultura e sua relação com a memória. Pensaremos os Videoblogs como um meio mutável e potente podendo ir além das formas convencionais de comunicação. Eles se destacam através do compartilhamento e a colaboratividade que envolvem os sujeitos em torno de situações reveladoras dos modos de articulação das subjetividades e as dinâmicas sociais do contemporâneo.


Palavras-chave

Relações sócio-técnicas; memória; narrativa; videoblogs.


No dia 13 de novembro de 2005 às 07:17 da manhã fiz a primeira postagem no blog que eu edito: Ciberexpressando... discutindo a socialight digital, eu, e outros papos. (www.ciberexpressando.blogspot.com). A audiência deste era, ou é, mínima se formos mensura-las através do número de pessoas que deixam seus recados por ali. Nas diversas experiências que adquiro, lembro de uma muito interessante, a amizade virtual com Malu, que desde 21 de março de 2007 às 00:04 da noite passou a ser colaboradora do blog.

Percebendo que a colaboradora comentava com freqüência conteúdos do blog, comecei a ficar mais atento tanto para os posts
[4] mais recentes quanto os mais antigos. Lembro de um videoclipe que ela postou e uma idéia que tive de republicar um texto sobre videoarte, mas agora relacionado a MTV Brasileira. Naquele momento, iniciava-se novas formas de relacionamento no blog. Informações passavam a ser compartilhadas e rearticuladas levando a alteração de outros posts, que passaram a utilizar recursos de vídeos e novos conteúdos que se relacionavam com as indagações da Malu e dos poucos leitores do blog. Estava em curso uma mudança nos modos de comunicação do blog, passava agora a criar uma espécie de comunicação mais colaborativa e menos ligada somente à transmissão de informações.

Diariamente vasculho o blog atrás de comentários, recentes ou não, que potencializam os conteúdos presentes nele. Por exemplo, Malu com freqüência faz comentários de posts antigos o que acaba por me levar a rearticular novos comentários. Ou seja, aquele tempo acumulado através dos posts não segue um ritmo cronológico, como o tempo do relógio, mas sim um tempo típico da comunicação e das relações subjetivas. Um ir e vir no tempo e no espaço.

É importante perceber nesse exemplo como são mobilizadas as formas de atuação social em rede identificando uma possível relação entre memória e narrativa. O que pretendo refletir neste texto é como se constrói a memória nestes territórios típicos da Cibercultura, como os Blogs, Vlogs, Orkut, Myspace, Second life, Youtube entre outros. Formas de comunicação, compartilhadas e colaborativas, que envolvem os sujeitos em torno de situações que revelam os modos de articulação das subjetividades e as dinâmicas sociais no contemporâneo.

Essas novas práticas comunicacionais, desenvolvidas em torno da Internet e de seus desdobramentos, rompem com a lógica da transmissão da informação, típica dos circuitos de comunicação de massa, e desenvolvem, com isso, novos modelos e formas de comunicação estruturadas em torno do que vem sendo conhecido como many-to-many ou muitos para muitos. O deslocamento que se opera diz respeito a uma ampliação da comunicação one-to-many ou um para muitos, típica da comunicação de massa, das transmissões broadcast como no caso das televisões, rádios, jornais entre outros, centradas em um emissor que mobiliza um conjunto amplo e diversificado de receptores distantes no tempo e no espaço.

Segundo os estudos de John B. Thompson (2002), podemos identificar três tipos de interação: são elas face a face, mediada e quase-interação mediada. As interações face a face utilizam da co-presença sendo dialógica (a relação entre aluno-professor na sala de aula) onde tempo e espaço são compartilhados. As interações mediadas também exploram a noção dialógica, mas não necessitam da presença do outro em um mesmo espaço (uma comunicação realizada através dos telefones). Por fim, as interações quase mediadas são aquelas onde existe um diálogo, porém a relação é monológica, ou seja, o contexto não é necessariamente o mesmo. Um grande exemplo é o modelo de transmissão da informação um para muitos gerado pela televisão num debate político qualquer.
Com o uso dos meios de comunicação, cada vez mais presentes em nossas vidas, passamos a experimentar essas outras formas de interação, agora mediadas, como nos mostrou Thompson. No entanto, o autor afirma que essa classificação das formas de interação pode ser alterada dada a incidência dos meios digitais e todas a possibilidades de recombinação e alteração das interações que se elegem por este meio.

Thompson (2002) chama atenção para essas novas formas de interatividade comunicacional onde não existe a necessidade do compartilhamento entre espaço e tempo. São elas típicas das comunicações realizadas via internet. Podemos relacionar tal fato as novas formas de interatividade que surgem através da hibridização, como nos blogs. Surge assim uma forma de tensão que afeta as relações interpessoais devido à desvinculação espaço-temporal propiciada pelos meios digitais, ou seja, uma substituição da co-presença pela tele-presença. Este fato merece destaque pelo grau de tensão que cria com as noções de proximidade e afastamento. As relações sociais em rede não dissolvem a noção de lugar, mas sim retrabalham as formas de se experimentar o espaço e o tempo.

Com o desenvolvimento das ferramentas da internet, como o WWW (World Wide Web), braço multimídia da grande rede que permitiu, ao longo do tempo, surge a incorporação de diversos recursos como imagens em movimento, sons e gráficos animados, entre outros. É importante perceber que as transformações ocorridas se dão graças ao intenso uso e apropriação das tecnologias pelas articulações da vida social, ou seja, uma seqüência de agenciamentos sócio-técnicos que possibilitaram uma nova situação comunicacional. Como nos mostra Lévy (1993):

Na época atual, a técnica é uma das dimensões fundamentais onde está em jogo a transformação do mundo humano por ele mesmo. A incidência cada vez mais pregnante das realidades tecnoeconômicas sobre todos os aspectos da vida social, e também os deslocamentos menos visíveis que ocorrem na esfera intelectual obrigam-nos a reconhecer a técnica como um dos mais importantes temas filosóficos e políticos do nosso tempo. (Lévy, 1993).


Essa nova situação vem gerando ao longo do tempo o que muitos autores tem chamado de Cibercultura, um desdobramento da cultura moderna, mas agora marcada pela incidência das tecnologias digitais, como nos mostra André Lemos:

A Cibercultura é a cultura contemporânea marcada pelas tecnologias digitais. Vivemos já a Cibercultura. Ela não é o futuro que vai chegar, mas o nosso presente (homebanking, cartões inteligentes, celulares, palms, pages, voto eletrônico, imposto de renda via rede, entre outros). Trata-se assim de escapar, seja de um determinismo técnico, seja de um determinismo social. A Cibercultura representa a cultura contemporânea sendo conseqüência direta da evolução da cultura técnica moderna. (LEMOS, 2003)

O pontapé inicial para o desenvolvimento da Cibercultura surge com a convergência das telecomunicações a partir da década de 70. Este campo pode ser entendido como uma mistura entre sociedade, cultura e novas tecnologias estabelecendo assim uma relação sócio-cultural de base micro-eletrônica. Tais bases disseminaram os PC – personal Computer (Computadores Pessoais) - e outras tecnologias como os chips e modens, que foram essenciais para o desenvolvimento das redes digitais.

Essas redes reunem vários meios de acesso ao conteúdo, desvendando através de inúmeros agenciamentos diversas modalidades comunicativas, novas formas de exposição das subjetividades, criação de narrativas e outras tensões em torno dos poderes globais gerados pela comunicação de massa. Passamos a ter uma multiplicidade de pontos de vista que se relacionam intensamente com os ambientes e manifestações da comunicação de massa em um intrincado e complexo jogo.
A construção deste jogo complexo nos leva a fazer uma releitura do dito popular “caiu na rede é peixe”, já que os rumores e balbucios dessas muitas vozes que compõem a Cibercultura são espalhados ou expostos em novos territórios como nos blogs. Estes surgem como uma alternativa para a transmissão de conteúdos que se diferenciavam das informações criadas para os websites. Os blogs funcionam como uma espécie de diários virtuais que utilizam comentários, postagens e outros recursos para filtrar a vida cotidiana e suas múltiplas facetas. Este cria um território confessional que garimpa o espaço intimo do sujeito tornando-o visível. Os blogueiros podem difundir informações com alto grau de importância fornecendo novos debates para a formação da opinião pública antes mesmo de entrar em pauta nos meios de comunicação de massa como ocorreu com o vídeo (gravado com uma câmera de celular) durante a execução do ditador Saddam Hussein, publicado em milhares de blogs ou portais como o Youtube
[5]. Para maiores informações temos como referência um estudo do caso no texto Saddan e Cicarelli: nossas imagens, por André Brasil e César Migliorin[6].

Inicialmente, o público que utilizava estes territórios era composto por jovens e adolescentes. Com o tempo os blogs se afrouxaram criando estreitas conexões com os meios de comunicação de massa, artistas, políticos e empresários entre outros. Temos como exemplo os blogs do portal Folha On-line
[7] ou os blogs empresariais que atuam pelo mercado, outro bom exemplo é estratégia da agência de publicidade Iso4 Comunicação[8].

Os blogs parecem revelar aspectos da rotina de seus usuários através de suas postagens e rumores que estas podem gerar. As postagens recentes estão interligadas com as mais antigas, gerando uma espécie de narrativa através dos posts, nas quais as atualizações em tempo real do blog são feitas de forma extremamente simples. Basta acessar o endereço, ler as postagens, deixar seu comentário e está pronto, sua vontade de expressão foi realizada em um simples click.

Com isso, somos capazes de idealizar, executar e disponibilizar idéias de forma simples através desses desenvolvimentos tecnológicos presentes no ciberespaço. Vale ressaltar que estes territórios sobrevivem através de freqüentes movimentações numa espécie de mutação ou desdobramento provindos de dinâmicas entre o campo tecnológico e a vida social.

No contexto do dito popular citado, podemos também pensar na WEB 2.0. Um fenômeno presente às novas formas de atuação do sujeito no ciberespaço, utilizando a amplitude que a rede nos proporciona para a difusão de idéias, compartilhamento de sentimentos, exposição dos pensamentos comuns e formas de demonstração das subjetividades que leva o sujeito a uma nova forma de rede social referente à natureza dos agenciamentos sócio-técnicos. De receptores agora nos desdobramos em interatores potencializando assim a presença do outro. Segundo Alex Primo:

A Web 2.0 é a segunda geração de serviços online e caracteriza-se por potencializar as formas de publicação, compartilhamento e organização de informações, além de ampliar os espaços para a interação entre os participantes do processo. A Web 2.0 refere-se não apenas a uma combinação de técnicas informáticas (serviços Web, linguagem Ajax, Web syndication, etc.), mas também a um determinado período tecnológico, a um conjunto de novas estratégias mercadológicas e a processos de comunicação mediados pelo computador (...) A Web 2.0 tem repercussões sociais importantes, que potencializam processos de trabalho coletivo, de troca afetiva, de produção e circulação de informações, de construção social de conhecimento apoiada pela informática. (PRIMO, 2006)


Dentro de um mundo de search, chats, wikis, comunidades virtuais entre outros surge a Blogosfera, fenômeno que precisamos prestar atenção. O impulso causado pelo advento da WEB 2.0 no ciberespaço tornou-se flexível os desdobramentos desses territórios que são formados através da colaboração entre os interatores. A blogosfera é justamente esse universo de blogs, fotologs, videologs que se encontram neste espaço de tensão.

O termo Blogosfera começou a ser utilizado como uma forma de piada ou descrição cômica referente aos alvoroços causados na esfera pública pelos Blogs. Tomaremos aqui os warblogs
[9] como exemplo. São estes blogs que tematizam as guerras e que ganharam destaque com suas publicações reveladoras de diversos questionamentos entre jornalistas, políticos, militares e outros durante recentes conflitos mundiais (invasão do Afeganistão, guerra do Líbano, entre outros). O debate gerado em torno do terrorismo pós 11 de Setembro, nos Estados Unidos, cria uma imagem espetacular da guerra nas mídias. Surge uma descrença das pessoas diante da credibilidade da informação que, para fugir dessa imagem compacta, migraram para os warblogs tornando-o um meio potente para construção da opinião pública. As informações difundidas pelos grandes meios passam a ser destrinchadas com os blogs.

Outra relação da palavra estaria ligada a idéia de logosfera (logo remete a idéia da palavra ou mundo de linguagem) e noosfera (ou como a palavra sugere, o mundo de pensamentos). Podemos pensar a palavra esfera como um campo ou mundo e será neste contexto que exploraremos a idéia de potência desses territórios..

A Blogosfera necessita de um olhar mais amplo do que a tentativa de explicação linear de sua evolução. Ela proporciona formas de desdobramentos que levam a utilização de meios potentes para construção da imagem ou exposição da subjetividade, os blogueiros, interatores da Blogosfera, estão interrelacionados compartilhando em um mesmo tempo, diversos territórios que se tornam presentes neste mundo. O que está em jogo são as construções temporais a qual estes criam buscando em novos territórios uma resposta sobre o significado do presente e a inserção do eu no nosso tempo. A idéia de interioridade foi aprofundada nos estudos de Paula Sibilia
[10] que reflete sobre estatuto do passado como um alicerce fundamental do eu. Junto das inúmeras subjetividades compartilhadas pelos sujeitos na Blogosfera, estão presentes vivências e experiências que articulam uma construção da memória onde passado, presente e futuro se entrelaçam num território íntimo, privado, público, fluido e abrangente. Os posts se atualizam articulando com o tempo e as trocas realizadas através da interatividade ou colaboratividade entre os interatores. Como cita Francisco Coelho dos Santos[11]:

Diferentemente de outras publicações na rede em que, por conta da inexorável atualização, todo conteúdo novo vêm se substituir ao similar existente que acaba de caducar, neles não há substituição: cada novo material postado é acrescentado ou já presente, independente do seu conteúdo. Eles se tornam, em conseqüência, uma implacável memória do que se passa ao longo de seu ciclo de vida. (SANTOS, 2007)
[12]
Tomando as reflexões de Santos é possível perceber que o tempo e a memória no universo dos blogs se articulam em outros arranjos.

Portanto, que os blogs sejam um lugar da memória pessoal ou familiar, um espaço de compartilhamento de gostos, preferências, experiências ou informações, que eles sejam, enfim, um ambiente para a publicação do que é confessional e/ou íntimo, o fato é que a nebulosa blog é um excelente barômetro do <>, do tempo em que o digital tem presença cada vez mais intensa na vida cotidiana e em que interação e conteúdo dividem o centro das atenções. (SANTOS, 2007)

O barômetro a qual Santos se refere pode ser pensada como o dispositivo criado através dos vídeos, comentários, textos acompanhados de imagem, reedição e outras formas utilizadas para narrar um fato nos blogs tanto no âmbito público quanto privado. Tais dispositivos devem ser analisados logo a frente ao observarmos atentamente as narrativas possíveis nos Videoblogs.

As vivências e experiências pessoais são reveladas nesses ambientes de exposição da subjetividade e intimidade onde a construção da memória estará ligada a formas de articulação temporal. Tomaremos aqui a idéia da memória em Roma e Pompéia.

Segundo SIBILIA (2004) a memória pode ser pensada em formas parceladas explorando a multiplicidade de camadas acumuladas, ou seja, semelhante ao que acontece em Roma desde a sua arquitetura até mesmo a articulação espaço-temporal surgindo assim a idéia de duração. Já em Pompéia uma reflexão sobre a totalidade da preservação que ocorre em momentos singulares, únicos ou pelo instante.

Segundo DUBOIS (1995) “de um lado, um tempo de acumulação, da propagação, da saturação, porém fragmentário; de outro lado, um tempo da captura, do corte, do instante, porém totalizante (...)”. Com isso à vontade do passado em unir a duração e o instante tornam-se impossíveis. São nestas tensões que surgem à força do agenciamento de natureza sócio-técnicas, deixando as imagens flexíveis diante da blogosfera.

As formas de produção de imagem hoje não possuem o compromisso de retratar a realidade em sua forma concreta, semelhante, como ocorria anteriormente. Hoje podemos reeditar, manipular, evocar, linkar e desdobrar as imagens em diversas outras vertentes que se tornam complexas. Com isso, estas podem revelar consigo questões além da estética, como também políticas, sociais, econômicas e culturais de uma forma muito mais flexível. Segundo SIBILIA (2004) “Cada vez mais, a vida passa a ser uma história inspirada nos modelos audiovisuais que permeiam e recriam constantemente o mundo, enquanto o eu se espelha nos personagens que desbordam das telas”. Além de pensarmos a existência das coisas através do tempo, onde tudo que existe está presente nele, a temporalidade passa a ser uma categoria sociocultural onde suas características são atualizadas com o próprio passar do tempo.

Imagens flexíveis pela blogosfera

Com o desenvolvimento dos blogs, surgem outras manifestações similares, mas que acabam por acrescentar novos recursos como as imagens em movimento configurando os chamados Videoblogs.

O Videoblog é um objeto de estudo pertinente na medida em que é um blog com o uso de vídeos que, agora, possui várias possibilidades de ampliação de construção de uma narrativa ao utilizar, além de textos, recursos audiovisuais.

Se a graça da Internet é permitir formas de comunicação alternativas aos modelos consolidados em outras mídias, por que o público deveria se conformar com vlogues que não passam de cabide para arquivos que poderiam ser vistos com mais resolução e conforto num aparelho de DVD em frente ao sofá da sala? (BASTOS, http://p.php.uol.com.br/tropico/html/textos/2639,1.shl)

Bastos reivindica uma atitude renovadora em relação aos Videoblogs. O “screenfull.net”
[13] é um bom exemplo de vlogs pois vai além da simples exibição de imagens partindo para um conceito mais amplo, uma linguagem híbrida, que envolve recursos de net.art, áudio, imagens, interatividade e experimentalismo. A interface se mistura ao conteúdo dos posts; os vídeos exibidos são leves, justamente pelo fato de não haver a intenção de ser um blog com vídeo. O screenfull tem a proposta de experimentação, de abertura frente às possibilidades que a web permite.
O videoblog apresenta uma linguagem em construção; ele surgiu e está inserido num meio tecnológico, que associa subjetividades e modos de vivência humana tendo como uma constante a natureza mutável. No entanto, para focarmos nossa análise, iremos nos basear nos estudos de Adrian Miles
[14] (2000), criador do primeiro videoblog em meados do ano 2000, o VLOG 2.1. Este Videoblog não se encontra mais na rede, mas é possível ter acesso a alguns trechos no blog[15] de Miles (2000).

O videoblog surgiu quando Miles (2000) teve a idéia de produzir vídeos com imagens feitas da janela de seu escritório e juntar a funcionalidade dos blogs com a potencialidade dos vídeos. Miles (2000) percebeu que poderia retratar tudo aquilo que vinha expondo em seu blog de uma nova forma. Logo em seguida, escreveu um manifesto chamado “Vogma: um manifesto” que retratava o que, para ele, seria um videoblog:

Um vog respeita a banda larga. Um vog não é apenas um vídeo (ele não é uma reinvenção da televisão). Um vog usa vídeos performáticos e/ou áudio. Um vog é pessoal. Um vog utiliza tecnologia disponível. Um vog experimenta com video e áudio autoral. Um vog mente entre a escrita e o televisual. Um vog explora a distante proximidade de palavras e midias movéis. Um vog é dziga vertov Jean-Luc Godard com um mac e um modem. Um vog é um vídeo blog no qual um vídeo no blog deve ser mais do que vídeo num blog. (MILES, 2000: http://hypertext.rmit.edu.au/vlog/)

Esse manifesto delineia o que seria um possível conceito de Videoblog segundo Miles (2000), mas é válido ressaltar que as estéticas ligadas à web estão sempre em processo construtivo, ligado a questões processuais, colaborativas e outras diversas vertentes de natureza instável. Logo, o Videoblog é uma ferramenta que está em mutação, em processo de construção constante.

Num meio dessas transformações seriam os Vlogs apenas vídeos disponibilizados na web? Como os Vlogs se apoderam das imagens? A imagem através dos vlogs vai além da sua própria exibição? Porque estes se diferenciam diante de diversas formas de propagação audiovisual na rede?

Olharemos para os Videoblogs como uma das dobras da Blogosfera, novo campo das relações em rede presente num contexto de natureza sócio-técnica. A diversidade está presente na Blogosfera na qual o modelo comunicacional adapta novas formas já citadas acima. Essa lógica, de natureza híbrida, está presente nas chamadas web-based comunitieis, ou seja, comunidade baseadas na rede onde “um efeito colateral de nossa vida digital é que nossas crenças e afiliações são publicamente acessíveis” segundo Barabási (ATAÍDE, 1997). Estas previlegiam a interatividade e a colaboratividade como processo de troca de conhecimentos e reflexão sobre as imagens.

O que eu digo um pouco hoje em dia é que para pensarmos o vídeo, talvez devamos parar de vê-lo como uma imagem e de remetê-lo à classe das (outras) imagens. Talvez não devamos vê-lo, mas concebê-lo, recebê-lo ou percebê-lo. Ou seja, considerá-lo como um pensamento, um modo de pensar. Um estado, não um objeto. O vídeo como estado-imagem, como forma que pensa (e que pensa não tanto o mundo quanto as imagens do mundo e os dispositivos que as acompanham). (DUBOIS, 2004)

Tomando a definição de Dubois (2004) de estado-vídeo
[16], então, o Vídeoblog talvez possa ser um encontro das imagens para que esta seja pensada e repensada, de forma coletiva, aberta e fluida. A natureza do vídeo é diferente nos Videoblogs; neste, as relações vão além de colocar o vídeo na Internet, eles possuem um auxilio de dispositivos provindos de comentários, atualizações, links e outros processos que solicitam mais do olhar diante da imagem presente.

Com a idéia da reflexão sobre a contemporaneidade através das imagens surge uma questão pertinente além da definição do que são os Videoblogs: são eles um local da memória? Os videoblogs podem revelar as dinâmicas sociais hoje em dia?

Segundo a comunidade Vlogs – Videologs no orkut, o vlog é “a mesma coisa do que Flog, sendo que além de você poder colocar Vídeos tb pode colocar fotos, Flash, Músicas, etc” (http://www.orkut.com/Community.aspx?cmm=2211904). Seriam apenas estas características mais centrais dos Vlogs?

Talvez não. Pensaremos como objeto de análise não somente os Vlogs em sua forma estável no Ciberespaço, mas sim a construção das narrativas através das postagens com vídeos que estes criam em tais diários virtuais. Propõe-se como método um Olhar narrativizante
[17] para se pensar os Videologs como um lugar da memória, onde as naturezas instáveis desse meio poderão revelar ou não as dinâmicas sociais presentes.

Nessa perspectiva, frente à dispersão social, a intervenção do pesquisador, ao eleger as narrativas como objeto de pesquisa, marca-se por um olhar narrativizante, que faz emergir as formas de articulação do cotidiano. Com isso, “narrar” apresenta-se como metáfora de “articular” e o trabalho do pesquisador funda-se na apreensão dessas relações. As narrativas emergem como interrelação das forças sociais, as mais diversas; caracterizam equacionamentos possíveis dessas forças, em pontos peculiares do fluxo histórico e social. (LEAL, 2006)

A relação espaço-temporal deve ganhar atenção para investigarmos esses terrenos a qual a memória pode se articular através das narrativas criadas pelos Vlogs. Estes vão além de uma cabine de vídeos, disponibilizando formas complexas de construção das narrativas que sugerem uma espécie de game entre o território e os articuladores que irão trabalhar com o tempo de acordo com suas intervenções na Blogosfera.

Os Videoblogs possuem como maior característica a capacidade de desdobramento nos diversos jogos entre territórios marcados por mutações e transformações. Mais importante do que responder o que são os Vlogs, seria identificar diálogos interessantes como a memória e relação espaço-temporal. Ou seja, um amplo terreno fragmentado com estilhaços de narrativas que possuem um saber, bem como ocorrem na constituição da nossa memória. Este texto é um recorte de uma pesquisa a qual venho fazendo com o propósito da ampliação de novos estudos a respeito da Blogosfera e dos Videoblogs como territórios potentes para se entender nosso tempo e a sociedade a qual estamos inseridos.

Referências bibliográficas

ATAÍDE, Maria Elza Miranda. O lado perverso da globalização na sociedade da informação. 1997. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0100-19651997000300006&script=sci_arttext. Acesso em: 19 maio. 2007.

BASTOS, Marcus. O grande vídeo. Disponível em: http://p.php.uol.com.br/tropico/html/textos/2639,1.shl. Acesso em: 19 maio. 2006.

CIBEREXPRESSANDO. Disponível em http://www.ciberexpressando.blogspot.com. Acesso em 19 de maio de 2007.

DUBOIS, Philippe. Cinema, vídeo, Godard. São Paulo: Cosac Naify, 2004.

DUBOIS, Philippe. A “foto-autobiografia”: a fotografia como imagem-memória no
cinema documental moderno. Imagens, Campinas, n. 4, p. 64-76, abr. 1995.

FOLHA ONLINE. Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/folha/blogs/. Acesso em 19 de maio de 2007.

ISO4WEB. Disponível em http://www.iso4web.com.br. Acesso em 19 de maio de 2007.

LEAL, B. S.. Saber das narrativas:narrar. In: Vera França; César Guimarães. (Org.). Na mídia, na rua: narrativas do cotidiano. 1 ed. Belo Horizonte: Editora Autêntica. 2006.

LEMOS, André; CUNHA, Paulo (orgs). Olhares sobre a Cibercultura. Sulina, Porto Alegre, 2003.

LÉVY, Pierre. As Tecnologias da Inteligência. Rio de Janeiro, Ed. 34, 1993.

MILES, Adrian. Entrevista à Folha de São Paulo. Folha de São Paulo. São Paulo, 24 nov. 2004. Folha on line. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/folha/informatica/ult124u17527.shtml. Acesso em: 14 abril. 2007.

MILES, Adrian. Vogma: a manifesto. 2000. Disponível em: http://hypertext.rmit.edu.au/vlog/. Acesso em: 19 maio. 2007.

PRIMO, A.. O aspecto relacional das interações na Web 2.0. In: XXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, 2006, Brasília. Anais, 2006.


SIBILIA, Paula. A vida como relato na era do fast-foward e do real time: algumas reflexões sobre o fenômenos dos blogs, ECO-UFRJ, 2004.

THOMPSON, John B. A mídia e a modernidade: uma teoria social da mídia. 4. ed. Petrópolis: Vozes, 2002.

VLOGS, VIDEOLOGS. Comunidade do Site Orkut. Disponível em http://www.orkut.com/Community.aspx?cmm=2211904. Acesso em 21 maio. 2007.

Notas de roda-pé

[1] Trabalho apresentado ao Intercom Júnior, no XXX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação.
[2] Graduando da Faculdade de Comunicação e Artes da PUC Minas – habilitação em Publicidade e Propaganda. Integrante do grupo de pesquisa “Poéticas audiovisuais contemporâneas”, cadastrado no CNPq. igor_lions@yahoo.com.br
[3] Professor da Faculdade de Comunicação e Artes da PUC Minas.
[4] Post - Termo designado ao ato de publicação de conteúdos nos blogs que podem ou não seguir uma linha cronológica.
[5] Acessar http://www.youtube.com/results?search_query=saddam%20hussein&search=Search
[6] Acessar http://www.fca.pucminas.br/ceis/textos/texto5.htm
[7] Acessar http://www1.folha.uol.com.br/folha/blogs/
[8] A agência criou uma empresa paralela para atuar no meio web. No site estão disponibilizados blogs de seus clientes. Ainda possui um blog pessoal que atua como portal para mediação entre as páginas empresariais, comunicação publicitária, prospecção de clientes e troca de informações com o meio acadêmico. Acessar http://www.iso4web.com.br/.
[9] Informação sobre os blogs de guerra no texto de Raquel da Cunha Racuero, disponível em http://www.versoereverso.unisinos.br/index.php?e=1&s=9&a=8. Acessado em: 29 de maio. 2007.
[10] Idéias presentes no artigo A vida como relato na era do fast-foward e do real rime: algumas reflexões sobre o fenômeno dos blogs. 2004.
[11] Professor adjunto da UFMG – Universidade Federal de Minas Gerais.
[12] Texto em desenvolvimento. Estudo ligado ao Grupo de pesquisa Redes Hipermidiáticas da PUC MINAS - Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, cadastrado pelo CNPq.
[13] De abe@linkoln e jimpunk. Conferir no link http://www.screenfull.net/stadium.
[14] Adrian Miles é professor e pesquisador na área de Hipermídia e Vídeo Interativo na RMIT University, Austrália.
[15] Conferir no link http://hypertext.rmit.edu.au/vlog/ .
[16] Conferir DUBOIS, Phillipe. Cinema, vídeo, Godard. São Paulo: Cosac Naify, 2004. (p. 97 – 116).
[17] Conferir LEAL, B. S.. Saber das narrativas:narrar. In: Vera França; César Guimarães. (Org.). Na mídia, na rua: narrativas do cotidiano. 1 ed. Belo Horizonte: Editora Autêntica. 2006.

Um comentário:

Thompson disse...

"Com o uso dos meios de comunicação, cada vez mais presentes em nossas vidas, passamos a experimentar essas outras formas de interação, agora mediadas, como nos mostrou Thompson."

mostrei, é?!?!...


rssss

abraços